marcelo martins

Os dois rebanhos que levaram o país ao brete

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A manifestação mais recente do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em um ato pró-intervenção militar mostra que o Brasil é um país tomado pelo vírus da insensatez e da ignorância. Infelizmente, somos uma nação que não cansa de surpreender negativamente. O Brasil, de outrora, alegre e diversificado - pelo próprio povo e com opiniões divergentes e, muitas vezes, conflitantes -, deu lugar a um mosaico cinzento e odioso. O eleitorado mostra que segue preso à tentação de falsos salvadores da Pátria. 

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No passado recente, tivemos Luiz Inácio Lula da Silva, que soube criar uma cisão entre o país. Ao se colocar como um operário, venceu a eleição ao dizer que seria "um governo do povo e para o povo". O eleitorado limitado e iludido deu a ele dois mandatos e reelegeu a candidata-poste dele. Vimos no que deu: Mensalão e Petrolão.  

No vácuo de uma liderança e, novamente desesperançoso, o Brasil queria e ansiava por um messias: forjado no ódio e na intolerância das redes sociais, deu-se voz e vez a um político do Baixo Clero da Câmara, Jair Messias Bolsonaro que "ganhou a todos" por "dizer o que pensa".

MESMA ESSÊNCIA
Bolsonaristas e lulistas quando se deparam com o espelho veem um ao outro. O ódio deles não é só quanto ao regime político-partidário, é quanto ao que há de mais valioso numa sociedade plural: a democracia. Eles não suportam um mundo onde o pensamento não seja único (ou seja, igual ao deles). 

A aversão deles é à democracia, é saber que mesmo ao vencer uma eleição, eles terão de ser submetidos, logo ali à frente, a um outro processo eleitoral. O ideal de mundo deles e de sociedade é o de uma unicidade típica do nazismo e do stalinismo. 

PERPETUAÇÃO
O projeto, dos dois lados, é de governo. Jamais houve ou haverá um projeto de Estado. Até porque isso exige a grandeza e o desprendimento de um gestor - o que, raramente, um político tem - de pensar e de buscar o desenvolvimento da nação.

O Brasil de hoje é o mesmo de ontem, só que pior: estamos numa pandemia, que assola o mundo, e vivemos, para piorar, um vácuo de representatividade e de liderança.  

AUSÊNCIA
O brasileiro, que pede intervenção militar e fechamento do Congresso e que vocifera contra a imprensa, é aquele mesmo que crê que cabe ao Estado tudo prover. Quem nega a democracia e que suplica pela volta da ditadura, é aquele mesmo que, quando a torneira dele seca, busca a imprensa para ter o problema resolvido.

Nessa dissonância cognitiva, o rebanho segue a manada rumo ao brete, onde será feito o abate da consciência, da leitura de mundo e, principalmente, da falta de um civismo responsável e crítico (o que não é apenas saber cantar o hino, como muitos pensam que seja). 

A FALTA QUE FAZ
Chegamos hoje àquela data que, no meu singelo entendimento, é a mais relevante do nosso calendário: a execução de Tiradentes, o nosso primeiro e genuíno liberal. Hoje, seria um daquelas datas que deveríamos todos reverenciar esse que é o principal nome dos ideais de liberdade de nosso país e que morreu por ela. Imaginem vocês, no século 18, a Coroa portuguesa saber da existência de um indivíduo que carregava consigo as ideias liberais - fundamentadas no individualismo.

O Brasil pelo qual Tiradentes foi executado (com esquartejamento) - ao observar o chamado "castigo exemplar" adotado pela Coroa - segue sendo algo distante. Tanto lá atrás quanto hoje, o Estado é intervencionista e parasitório - basta lembrar que trabalhamos mais de seis meses para manter os privilégios de uma classe política inoperante, bem como os elevadíssimos custos de uma máquina pública burocrática. Nem por isso, justifica-se o fechamento do Congresso. Mas, sim, de acabar com privilégios e aperfeiçoar nossas instituições.

Até porque, embora muitos digam que não, é na política e na democracia que poderemos lapidar o melhor de todos nós, bem como azeitar imperfeições e reconhecer erros e limitações. O que o Brasil precisa é que os brasileiros - que não são adoradores de políticos messiânicos - ganhem anticorpos frente ao vírus da intolerância, da cegueira e do pensamento ruminante e de má-fé.

Quem sabe assim, possamos, por meio da democracia, que é falha (mas extremamente compreensiva), mostrar a esses dois grupos que com serenidade e razão possamos todos voltar a conviver de forma respeitosa. 

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